O São Paulo encarou o confronto com o Boca como a razão de ser da competição, dando mais importância a ele do que ao próprio título. Os 47 mil torcedores de ontem no Morumbi certamente não seriam mais de 15 mil se o adversário fosse o Arsenal Sarandí, por exemplo. As atenções do Tricolor paulista agora devem se voltar principalmente para o Brasileirão, mesmo com a boa "gordura" à frente do Cruzeiro.
Vasco e Botafogo, mesmo sem conquistar um título internacional há anos, não escondem que suas metas do semestre são a vaga para a Libertadores. É aqui que a coisa fica estranha, e para explicar coloco a pergunta feita pelo Paulo Vinícius Coelho, o PVC: "É mais importante uma vaga para a Libertadores ou o título da Sul-Americana?" E a resposta, para a maior parte dos casos, é simples e direta: o título da Sul-Americana.
A ainda vigente tese dos "times grandes" faz com que a disputa da Libertadores seja encarada como um selo de qualidade aos times brasileiros, como se a conquista de uma das vagas representasse a redenção a anos de jejum de títulos. Note que sempre se fala em "vaga" para a Libertadores, e não em "título". É notório que a esmagadora maioria dos times "grandes" não tem a menor condição de vencer uma Libertadores, mas usa a simples - e às vezes vexatória - participação para acalmar os ânimos da torcida. O tradicional panis et circensis em versão futebolística - mas sem o pão.
Os casos de Vasco e Botafogo (que, no momento, toma um sufoco do River, mesmo com um a mais) são emblemáticos. Os dois estão no meio de uma ferrenha briga pelas duas vagas restantes do Campeonato Brasileiro, e pelo que vêm apresentando nas últimas rodadas as chances de as conseguirem são menores que as de seus adversários. Mesmo assim, duvido que venham a priorizar a Sul-Americana, mesmo estando a apenas seis jogos de um título inédito. Se tiverem que poupar alguém não será no tormeio nacional. Em nome da heróica vaga na Libertadores.
Vejamos as duas hipóteses. Garantindo a tal vaga, o time se mistura a outros 31 da América do Sul (entre eles os melhores da Venezuela e Bolívia, por exemplo), e faz ao menos seis jogos na primeira fase, três deles em casa. Tem certa renda e pode chegar às oitavas-de-final. Nesse caso teria mais um jogo em casa, com uma renda maior, mas sem um time e uma comissão técnica preparados para uma Libertadores, dificilmente chegarão às quartas (os casos recentes dessa possibilidade são diversos). Em resumo, o clube daria o prazer a sua torcida de assistir a quatro jogos em casa contra time fracos ou médios, mas seria eliminado e sumiria junto com os tais melhores da Venezuela e Bolívia. E de quebra não disputaria a Copa do Brasil.
Agora, se privilegiasse o título da Sul-Americana, esse mesmo time teria quatro jogos em casa (contados a partir das oitavas-de-final) de alta atratividade para sua torcida, o que geraria boas rendas de billheteria. Se realmente ganhasse o título, esse faturamente aumentaria ainda mais com os prêmios dados pela Conmebol. O time teria uma grande visibilidade na América do Sul, pois além do título disputaria no ano que vem a Recopa contra o vencedor da Libertadores. E, mais importante, traria um troféu inédito para a galeria.
Analisando friamente, parece não haver dúvidas de que para a maioria dos times brasileiros (em situação semelhante às de Vasco e Botafogo), vale mais a pena investir no título da Sul-Americana do que em uma vaga para a Libertadores. Mas o complexo de superioridade de dirigentes, técnicos e torcedores turva a visão para a realidade, e uma competição que tem toda a chance de "pegar" continua em segundo plano para o futebol brasileiro.
* Comecei a escrever logo após o segundo gol do Botafogo, que teoricamente o classificaria para as quartas-de-final. Até como mostra da minha incredulidade do que aconteceu hoje no Monumental de Nunez, preferi deixar o texto como estava, o que não invalida o seu conteúdo. Para quem viu o jogo, fica claro que um clube ainda em reestruturação não tem condições de fazer encarar de frente uma Libertadores. Mas, para o Fogão, a sonhada vaga é o que restou para 2007. Algumas coisas, realmente, só acontecem com o Botafogo...
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