Se isso acontece nas maiores empresas do mundo, não é de se estranhar que o mesmo ocorra no futebol, que encontra barreiras legais mais facilmente transponíveis. No Brasil, onde impera a impunidade e o esquecimento, o problema deve ser ainda mais crítico. Não faltam exemplos de relações, no mínimo suspeitas, de empresas privadas com o meio futebolístico brasileiro:
- São Paulo e IBF: a empresa, patrocinadora do time no biênio 1991/92, além de ter a falência decretada por crimes de sonegação fiscal, tinha relações bem próximas com Fernando Collor, então Presidente da República. O dono da empresa, Hamilton Lucas de Oliveira, foi o responsável também pela compra da Rede Manchete, em 1992. Em 1993, o empresário foi condenado na CPI da TV Jovem Pan pelos crimes de corrupção ativa, formação de quadrilha, sonegação fiscal e enriquecimento ilícito.
- Palmeiras e Parmalat: a mais bem sucedida parceira do esporte brasileiro rendeu muitos títulos ao time. A parceria teve fim em 2000, e em 2005 foi decretada a falência da empresa italiana com seu fundador, Calisto Tanzi, processado pelo crime de "manipulação da bolsa de valores". Esse ato gerou prejuízo a mais de 135.000 italianos.
- Vasco e BMG: aproveitando a exposição pelo gol 1000 de Romário, no início do ano, o clube cruz-maltino fechou um contrato de patrocínio com o Banco BMG. Além do time carioca, o banco também era um dos patrocinadores oficiais do mensalão petista.
Os casos acima são apenas alguns exemplos, e com certeza existem muitos outros Brasil afora. Essas relações, porém, não significam necessariamente que as Diretorias dos clubes citados pratiquem atos criminosos, mas apenas indica que o futebol representa um meio propício a essas práticas.
Antes de mais nada, queria deixar claro uma coisa: os exemplos acima não são únicos. Duvido que haja um time no Brasil que, em algum momento de sua história, não tenha cometido algum tipo de ilegalidade. E também não significa que os sucessos alcançados por eles decorreu da prática de atos ilícitos. Não existiu esquema IBF ou Parmalat.
O que diferencia o caso Corinthians/MSI, e o torna mais grave que todos os outros, decorre dos seguintes aspectos:
1) Ato coletivo da Diretoria: a "parceria" não pode ser imputada a um particular da administração do clube, visto que foi aprovada pela maioria do Conselho Deliberativo. O mesmo Conselho que hoje lava as mãos e pede o impeachment de Dualib.
2) É impossível negar a culpa: só alguém muito ingênuo, ou inescrupuloso, poderia afirmar que o interesse da MSI pelo futebol brasileiro não era suspeita. Afinal, é bem estranho uma empresa dirigida por um iraniano radicado em Londres que se diz responsável por um fundo de investidores não identificados (quando se sabia muito bem que esse tal investidor era um bilionário russo foragido). Até porque o Corinthians, principalmente nos 14 anos de gestão Alberto Dualib, virou "craque" em parcerias, firmando três delas desde 1997.
3) Comprovação dos crimes praticados: muito mais do que ligações excusas envolvendo dirigentes e empresários, já está praticamente provado pela Polícia Federal que os negócios envolvendo o Corinthians e a MSI tinham por objetivo atos criminosos, como a lavagem de dinheiro. Marcou oficialmente a entrada do futebol brasileiro na rota do crime organizado internacional.
4) Influência direta no futebol: também é inegável que o dinheiro "investido" pela MSI foi fator decisivo no título do Campeonato Brasileiro de 2005, afinal o "fundo de investimentos" foi o responsável pela contratação e pagamento de salários da esmagadora maioria dos jogadores daquele time. Foi uma ilegalidade revestida de legalidade, visto que contratar jogadores não é contra a lei (também não acredito que existiu interferência da MSI no esquema de arbitragem daquele ano). O problema foi a origem e o tratamento do dinheiro para tal.
Por tudo isso, e para que se evite novos casos, é que as punições tanto a dirigentes como ao próprio clube devem ser severas. Se previsto na lei, envolvendo prisões e até rebaixamento do Corinthians.
Alguém pode falar que não é justo punir a torcida por atos cometidos por dirigentes. Até pode ser verdade. Mas, se a punição não vier, nada impede que novas levas de dirigentes pilantras pratiquem os mesmos atos. E também não me lembro de nenhum torcedor corintiano, mesmo tendo todos os motivos para suspeitarem da "parceria" em 2004, condená-la. Ao contrário, compraram milhares de camisas com o nome 'Carlitos' estampado nas costas e até entoaram gritos de "O Kia é da Fiel!" nos estádios.
Se a palavra da hora no Brasil é "Cansei", deve ser o momento de a impunidade dar um basta. Fazendo um paralelo com nossa política, Dualib e cia. devem ter punições tão rigorosas como os protagonistas do mensalão, a máquina de corrupção instituída por membros do governo petista para se perpetuarem no poder. Os dois casos, mesmo não sendo isolados, são as maiores provas concretas de corrupção em seus respectivos meios de que temos conhecimento.
Conhecimento semelhante que Alberto Dualib tinha das intenções da MSI; que o Presidente Lula devia ter do mensalão; e que os dois tinham de Boris Berezovski, fato este que não os impediu de se reunirem a fim de discutir uma permissão de entrada do russo no território brasileiro.
Um comentário:
Análise perfeita, separando o joio do trigo. E "El el el, o Kia é da Fiel" foi f... mesmo.
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