quinta-feira, 16 de agosto de 2007

História sem fim

Resolvi esperar o pronunciamento dos jogadores para escrever a respeito da entrevista coletiva dada ontem pelo Ricardinho. Agora, com as versões de Giba e Gustavo sobre o assunto, a versão "mais verdadeira" da história começa a tomar forma, e o (ex?) levantador da Seleção fica, cada vez mais, com a maior parcela da culpa.
Desde o corte do jogador, à vésperas do Pan, me posicionei favoravelmente ao técnico Bernardinho. Não por achar que ele está acima do bem e do mal, mas por entender que dentro de um grupo como uma equipe esportiva há uma hierarquia a ser respeitada, ainda mais se essa autoridade atingiu o status que tem através de comprovada competência e resultados. Bernardinho pode ser vaidoso, autoritário, mas não acho que seja burro a ponto de tirar do time o melhor levantador do mundo por simplórios motivos pessoais. Ainda mais com o histórico do Ricardinho, que já havia causado problemas - dentro de quadra, inclusive - no último Mundial.

A coletiva do levantador foi, por alguns aspectos, lamentável. Primeiro, por seus comentários em si. Frases como "A família Bernardinho acabou para mim", "A medalha do Pan foi arrancada do meu peito" e "Ele vai ter que me procurar para se explicar" mostram um comportamento rancoroso e até certo ponto infantil, inclusive se levarmos em conta que provavelmente ele não está com a razão. Com essas frases ele se coloca acima Seleção, como se ela fosse a única interessada em seu retorno. É preciso lembrar que, no vôlei, a grande vitrine mundial é a Seleção, e não os clubes como acontece no futebol. Todos os grandes jogadores do Brasil estão aonde estão por causa do título Olímpico, dos dois Mundiais e das sete Ligas conquistadas, e não por alguns campeonatos europeus e brasileiros que provavelment devem ter em seus currículos.

Esse era o momento do Ricardinho ponderar, com calma, a sua parcela de culpa na história e o seu papel na Seleção.

O outro motivo foi a razão da coletiva. Lançar a tal biografia nesse momento foi puro oportunismo. Eu sei que ele já estava trabalhando no projeto há algum tempo, mas encerrar um livro sobre a sua vida com um capítulo em tom negativo, menos de um mês após ocorrido, não faz o menor sentido. A não ser que a real intenção seja levantar novamente a polêmica. E vender mais exemplares, claro.

Permitam-me uma digressão agora. Tudo bem, todo mundo tem o direito de escrever o que quiser, quando quiser, ainda mais sobre a própria vida. Mas uma biografia escrita pela própria pessoa, aos trinta e poucos anos de idade e no auge da carreira não me desperta a MENOR curiosidade. Como a própria palavra diz, biografia quer dizer a 'história', ou 'descrição', da 'vida'. Por si só o livro já não tem final, pois a vida dele ainda não acabou - e está bem longe disso. Se fosse uma biografia esportiva, tudo bem. Mas nem isso é, visto que o jogador ainda se encontra em atividade.

Autobiografias também carregam um alto grau de viés, pois engloba apenas um ponto de vista, o do biografado. Dificilmente, ao ler o livro, conheceremos um Ricardinho humano, com seus defeitos reconhecidos e suas vitórias comedidas. Até porque é impossível um livro com maior viés humano do que esse, finalizado às pressas e ainda com lágrimas de raiva no rosto. Para que se conheça os verdadeiros efeitos de um fato, é preciso deixar que ele se sedimente, e só depois analisá-lo. A briga Bernardinho x Ricardinho ainda páira no ar, num redemoinho.

Ruy Castro, autor da maravilhosa biografia de Garrincha, já afirmou que "Biografado bom é biografado morto". Faz sentido. Até porque, desta forma, a história pode ser contada do início até o final. Se a vida do Mané fosse contada após a Copa de 62 (como deve ter sido por alguns) a história não teria o brilho e a triste veracidade que teve, mais de 30 anos depois.

Ricardinho, ainda bem, não está morto, e depende apenas dele deixar a coisa acalmar para tomar a melhor decisão possível: continuar escrevendo sua história na Seleção Brasileira.

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