segunda-feira, 30 de julho de 2007

Todo Carnaval tem seu fim

Acabou-se o que era doce. Depois de anos de preparo, bilhões de reais públicos gastos e dezenas de medalhas conquistadas pelos brasileiros, o Pan do Rio chegou ao fim. Para os amantes do esporte como eu, essas últimas duas semanas foram de rara diversão. Já estou contando os dias para as madrugadas em claro de Pequim. Para os cariocas, foram duas semanas naus quais esqueceram os problemas cotidianos e brincaram de ser felizes. Agora, a ressaca da segunda-feira de Cinzas.
Mas... valeu a pena tudo isso?

A pergunta não admite um simples 'sim' ou 'não' como resposta, e na minha humilde tentativa de respondê-la resolvi dividí-la em três partes: o antes, o durante e o depois.

O antes foi um desastre. Milhões transformaram-se em bilhões da noite para o dia, licitações foram descartadas como resto de comida, prazos foram extendidos até a véspera e promessas foram ignoradas, pois na verdade não poderiam mesmo se tornar realidade. Depois do que aconteceu por aqui, pudemos ver que essas práticas não são exclusividade nossa, - o orçamento de Londres 2012 já estourou em cinco vezes - mas cada um com seus problemas. Não é por isso que podemos achar normal e inevitável que isso aconteça, nos tirando o direito e o dever de fazer as devidas cobranças.

O durante, na minha opinião, teve sucesso maior. Contrariando alguns prognósticos, não tivemos problemas generalizados durante o Pan. Tudo bem, as disputas de beisebol e softbol foram uma tragédia, imprensa e torcedores tiveram problemas nos primeiros dias - devido à falta de tempo para eventos-teste, por causa dos atrasos nas obras - e a galera passou fome durante os jogos. Mas não tivemos cenas de colapso, e de maneira geral, tudo correu bem. Era impossível que o Brasil não conseguisse ser superior à República Dominicana. Até os transportes funcionaram bem, segundo amigos meus que foram ao Rio. As bonitas festas de abertura e encerramento fizeram juz aos 16 dias dos Jogos.

Nossos atletas também merecem os elogios. Este blog fez sua parte, listando todos os medalhistas brasileiros deste Pan. Um singelo modo de perpetuar suas conquistas.

Agora, a parte mais complicada. Foi bonito, legal, mas nada garante que continuará sendo. Os
atletas, pelo menos os que ganharam medalhas, devem ter certa tranquilidade até as próximas Olimpíadas, com patrocínios e condições de treinamento. Mas nada indica que ocorreu uma mudança na mentalidade do investimento no esporte do País. Até porque a decepção em Pequim pode ser grande. Aqueles que acham que o Pan do Rio revolucionou o esporte nacional tornando o Brasil uma potência olímpica, terão uma surpresa nada agradável. Como eu disse no início do Pan, os resultados que tivéssemos deveriam ser comemorados com racionalidade. Os "novos ídolos do esporte brasileiro" que a Globo tanto quer promover não são tão bons assim.

Apenas como exemplo, analisemos a natação e o atletismo. Se pegarmos todos os tempos dos brasileiros neste Pan e compararmos com os das mesmas provas na Olimpíada de Atenas, apenas César Cielo nos 50m livre e Thiago Pereira nos 200m medley ganhariam medalha. A maioria nem chegaria perto. Claro que ainda temos tempo, e se pegarmos as melhores marcas do ano de alguns atletas (Jadel Gregório, por exemplo, saltou debaixo de chuva no Rio) temos outras provas em que podemos ser competitivos. Então, muita calma nessa hora.

Também não sabemos como será a utilização das arenas esportivas nos pós-Pan, o maior legado que o evento deixou para a cidade do Rio de Janeiro. Assim como no caso dos patrocínios esportivos, teremos de aguardar. Com a diferença de que a imprensa não deverá ter muito empenho em divulgar, já que a população em geral não terá muita curiosidade em saber o que está sendo feito com ginásios construídos com o SEU dinheiro.

E, por fim, sobra o projeto Rio-2016. O bom andamento do Pan credenciou o Brasil - pelo menos na cabeça do Nuzman - para sediar os Jogos Olímpicos. Nem a enorme distância entre os dois eventos convencerá os mais afoitos do contrário. A maior diferença entre o Rio-2007 e o Rio-2016 é simples: enquanto o primeiro foi um evento municipal, o segundo será mundial. Poucos torcedores presentes nas arquibancadas neste Pan eram de fora do Rio, e quase nenhum de outro país. O Pan empolga apenas os moradores da cidade-sede. Já uma Olimpíada atrai turistas do mundo inteiro, e para isso é fundamental investimentos em transportes, por exemplo - coisa que o Pan não fez, já que não seria preciso. Isso sem considerar ainda o número de atletas, bem maior.

Resta saber se o Rio, ou qualquer outra cidade brasileira, tem condições para tais investimentos, e a que custo isso virá. Continuo com a opinião que temos problemas mais sérios para serem solucionados, e que não podemos usar a "desculpa" de um evento esportivo para fazê-lo. Eles devem ocupar as agendas dos nossos governantes por sua própria importância, e não devido a eventos carregados de interesses políticos, eleitoreiros e narcisistas.

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